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4 de setembro de 2010

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Pretexto



O que eu gostaria de fazer é um livro sobre nada.
Foi o que escreveu Flaubert a uma sua amiga em 1852.
Li nas Cartas exemplares organizadas por Duda Machado.
Ali se vê que o nada de Flaubert não seria o nada existencial,
o nada metafísico. Ele queria o livro que não tem quase tema
e se sustente só pelo estilo. Mas o nada de meu livro é nada mesmo.
É coisa nenhuma por escrito: um alarme para o silêncio,
um abridor de amanhecer, pessoa apropriada para pedras,
o parafuso de veludo, etc, etc. O que eu queria
era fazer brinquedos com as palavras.
Fazer coisas desúteis. O nada mesmo.
Tudo que use o abandono por dentro e por fora.

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As coisas tinham para nós uma desutilidade poética.
Nos fundos do quintal era muito riquíssimo o nosso dessaber.
A gente inventou um truque para inventar brinquedos com palavras.

O truque era só virar bocó.
Como dizer: eu pendurei um bentivi no sol...


Será que fizeram o beija flor diminuido só para ele voar parado?



As distâncias somavam a gente para menos.



(Manoel de Barros - Livro sobre nada)

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Um comentário:

Denise Portes disse...

Você sempre postando esses textos lindos. Que bom que você voltou a visitar meu blog.
Beijo
Denise